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Bombelli e os números complexos

Há cerca de 500 anos atrás, quando matemáticos ainda se debatiam com números negativos, uma nova classe de números ainda mais estranha surgia: os números complexos. Apesar de realizarem seu début na obra de Cardano, coube a Rafael Bombelli (1526 – 1572) iniciar o primeiro estudo sistemático desses objetos que viriam revolucionar o conceito de número.

Bombelli foi um engenheiro talentoso que viveu em um ambiente intelectual onde as mais avançadas técnicas algébricas estavam facilmente disponíveis. Fazendo bom uso de sua mentalidade prática, escreveu um livro que pode ser lido ainda hoje por leigos e profissionais. Editado no mesmo ano da morte de seu autor, em 1572, essa obra possui o título originalíssimo de… Algebra.

Possuidor da rara virtude de ser claro e acessível, esse livro fez com que Bombelli se tornasse o primeiro europeu a escrever as regras de operação com números inteiros:

Mais vezes mais faz mais.

Menos vezes menos faz mais.

Mais vezes menos faz menos.

Menos vezes mais faz menos.

Mais 8 vezes mais 8 faz mais 64.

Menos 5 vezes menos 6 faz mais 30.

Menos 4 vezes mais 5 faz menos 20.

Além disso, 5 vezes menos 4 produz menos 20.

Da Algebra, de Bombelli

Mais do que pelo seu trabalho com inteiros, Bombelli se destaca na história da matemática por ter sido o primeiro a operar com números complexos, aqueles que envolvem raízes de números negativos, como vistos nesse post.

Bombelli teve a presciência de perceber como os complexos eram essenciais na resolução de cúbicas e quárticas e possivelmente em outros problemas. Ele introduziu a simbologia \sqrt{-1}, que mais tarde viria a ser simplificada para i por L. Euler (1707 – 1783), para dar um perfil manuseável a esses números.

Bombelli sabia que os complexos eram potencialmente problemáticos. Entendia que não eram positivos nem negativos, e também que considerá-los como simples raízes era uma fonte de confusão – o que de fato aconteceu com os matemáticos dos séculos seguintes. Ao chamar a \sqrt{-1} de “mais de menos”, e - \sqrt{-1} de “menos de mais”, Bombelli forneceu as regras formais de operação que usamos ainda hoje, revelando a índole mecânica da álgebra, que não necessita de significados concretos para funcionar perfeitamente. Além disso, os complexos nos mostraram que pensar números como representações de quantidades ou magnitudes é tão falso quanto imaginar que lógica e leis do pensamento são sinônimas.

Os números complexos são absolutamente essenciais na matemática pura e aplicada. Aparecem na solução de diversos tipos de equações diferenciais, presentes na maioria dos modelos que os cientistas criam sobre o mundo. Sem elas, você não estaria lendo este texto na tela de seu computador ou celular. Ao observar a imensa gama de suas aplicações, percebemos que são os bizarros complexos, para os quais temos imensas dificuldades em atribuir um sentido concreto, os mais práticos dos números que conhecemos.

Discussão

  1. O que é um número?
  2. Bombelli conseguiu escrever um livro que era ao mesmo tempo profundo e simples de se ler. Você consegue citar algum outro livro de matemática com essas qualidades?
  3. Fractais, como aquele no início deste texto, são criados com a manipulação computacional de números complexos, e servem como uma das portas de entrada para a reflexão sobre arte e matemática. Por que será que tanta gente vê relações entre esses dois domínios aparentemente tão distantes?

Para saber mais

  • equações diferenciais
  • modelo matemático
  • fractais

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